Há, como sempre houve, muita ligação entre o emprego dos pais e a constituição familiar. 


E cada época tem o seu linguajar próprio, o definidor da consciência da época. 


Ordenado era o quanto um trabalhador contratado ganhava pelo trabalho do mês, num emprego fixo naquele passado pouco distante de 2021. 


Havia rudimentarmente um modesto e incipiente plano de carreira por ali. Conforme se ia aprendendo os segredos da lavoura, do terreiro, da usina de açúcar e álcool, da metalúrgica, da siderúrgica enfim ... com o domínio da técnica vinha o aumento. 


Com o aumento o trabalhador ia galgando seu lugar na fazenda, na empresa e na sociedade.


Talvez seja por isso que nos velhos tempos o mundo do trabalho tinha esse linguajar assim bem mais próximo da sustentabilidade familiar e do posicionamento socioeconômico do trabalhador.


Contemplava, claro, um contentamento descontente, havia um teto meio inescrupuloso em que filhos de ricos tinham mais pernas e fôlegos e filhos de pobres sabiam já é precisavam se contentar com qual  seria seu teto de vida predeterminado pelo ordenado do pai, depois o da mãe e o dele mesmo ou dela.



Ser rico era coisa para o filho do patrão do pai, que, pelo ordenado da família, tinha distância entre um e outro, mesmo quando, porventura brincavam junto.


Ordenado é uma  palavra que me coloca em transe até agora. 


Primeiro,  o prefixo da palavra ordenado é ordem, e ordem remete à organização que, no Brasil, propala-se até na Bandeira Nacional.


Com o ordenado o trabalhador de outrora mensurava sua condição para angariar os proventos da família e colocá-la na ordem do progresso evoluindo através dos filhos e netos. 


Era um mundo em que todos se sentiam contemplados de um jeito ou de outro. Não precisamos lembrar os conflitos que por lá também existiam, mas até isso aproxima-se da possibilidade de ser mais harmoniosamente resolvido.


Havia os sem ordenado  também , os sem trabalho fixo, os diaristas, todos que precisavam achar um lugar na ordem social para chegar em algum lugar pela órbita do progresso.


Hoje a palavra salário substitui  o que magicamente era entendido pela família como ordenado.


Num País de trabalhadores informais, com 14 milhões de desempregados e já milhões vivendo abaixo da linha da miséria, a palavra ordenado ajuda a ver a desordem em que vivemos. 


Sobretudo porque governos e líderes políticos por aqui brigam muito por eles, entre eles, mas o povo está sem ordenado para as contas do fim do mês. 


Fim do mês? Nem fim de semana, fim do primeiro dia de luz, água e gás cortados, panelas vazias e filhos chorando de fome. Desordenado, desempregado e sem esperança. 


Pessimista? Eu? Isso era meu avô com aquele ordenado. Eu sou revoltado!


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